Fazendo uma justa homenagem a Adoniran
Até hoje nas rodas de samba por toda a São Paulo sempre tem um que começa com o característico “Cai cai cai cuns lá” e os sambistas já se lançam de Saudosa Maloca, é tradição, é emoção é uma sucessão de arrepios nos representantes da velha guarda do samba paulistano, para não dizer brasileiro, e não é por me considerar roqueiro que não me dobro ao poder de uma letra simples e que conta a história (quase escrevo História só para dar a devida importância), da triste sorte dos três amigos dos quais só se sabe o nome de dois pois o primeiro é simplesmente tratado pela pessoa do autor. E o que dizer da frase de Joca “Deus dá o frio conforme o cobertor” simples direto e sábio, fora o fato de que isso ainda é uma realidade de vários sobreviventes aqui nesta grande megalópole paulistana, fico até grato por ouvir o português errático com o qual ele descreve a triste epopéia do trio que é forçado a viver na miséria e em gramados da grande São Paulo mendigando e Biscateando trocados, enquanto clamam a saudades do seu reino que fora demolido forçando-os a condição máxima da pobreza.
Saudosa Maloca
Adoniran Barbosa
Si o senhor não está lembrado
Dá licença de contá
Que aqui onde agora está
Esse edifício arto
Era uma casa véia
Um palacete assombradado
Foi aqui seu moço
Que eu, Mato Grosso e o Joca
Construímos nossa maloca
Mais, um dia
Nem nóis nem pode se alembrá
Veio os homi cas ferramentas
O dono mandô derrubá
Peguemo todas nossas coisas
E fumos pro meio da rua
Aprecia a demolição
Que tristeza que nóis sentia
Cada táuba que caía
Duia no coração
Mato Grosso quis gritá
Mas em cima eu falei:
Os homis tá cá razão
Nós arranja outro lugar
Só se conformemo quando o Joca falou:
"Deus dá o frio conforme o cobertor"
E hoje nóis pega a páia nas grama do jardim
E prá esquecê nóis cantemos assim:
Saudosa maloca, maloca querida,
Dim dim donde nóis passemos os dias feliz de nossas vidas
Saudosa maloca,maloca querida,
Dim dim donde nóis passemo os dias feliz de nossas vidas.
Posteriormente ele retorna ao tema em Abrigo de Vagabundos, que mostra que mesmo na adversidade é possível através da esperança e perseverança superar qualquer obstáculo e construir um presente melhor para si mesmo e que não se deve esquecer nunca de continuar lutando... e ainda ali ele se lembra dos amigos perdidos e deseja encontrá-los para abrigá-los em sua morada e tirá-los da marginalidade, prova máxima de humildade e dedicação aos amigos, como seria bom termos vários destes mártires silenciosos.
Abrigo de Vagabundos
Adoniran Barbosa
Eu arranjei o meu dinheiro
Trabalhando o ano inteiro
Numa cerâmica
Fabricando potes
e lá no alto da Moóca
Eu comprei um lindo lote dez de frente e dez de fundos
Construí minha maloca
Me disseram que sem planta
Não se pode construir
Mas quem trabalha tudo pode conseguir
João Saracura que é fiscal da Prefeitura
Foi um grande amigo, arranjou tudo pra mim
Por onde andará Joca e Matogrosso
Aqueles dois amigos
Que não quis me acompanhar
Andarão jogados na avenida São João
Ou vendo o sol quadrado na detenção
Minha maloca, a mais linda que eu já vi
Hoje está legalizada ninguém pode demolir
Minha maloca a mais deste mundo
Ofereço aos vagabundos
Que não têm onde dormir
Fazendo uma justa homenagem a Adoniran
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