Fazendo uma justa homenagem a Adoniran

28/09/2011 10:36

 

Até hoje nas rodas de samba por toda a São Paulo sempre tem um que começa com o característico “Cai cai cai cuns lá” e os sambistas já se lançam de Saudosa Maloca, é tradição, é emoção é uma sucessão de arrepios nos representantes da velha guarda do samba paulistano, para não dizer brasileiro, e não é por me considerar roqueiro que não me dobro ao poder de uma letra simples e que conta a história (quase escrevo História só para dar a devida importância), da triste sorte dos três amigos dos quais só se sabe o nome de dois pois o primeiro é simplesmente tratado pela pessoa do autor. E o que dizer da frase de Joca “Deus dá o frio conforme o cobertor” simples direto e sábio, fora o fato de que isso ainda é uma realidade de vários sobreviventes aqui nesta grande megalópole paulistana, fico até grato por ouvir o português errático com o qual ele descreve a triste epopéia do trio que é forçado a viver na miséria e em gramados da grande São Paulo mendigando e Biscateando trocados, enquanto clamam a saudades do seu reino que fora demolido forçando-os a condição máxima da pobreza.

 

 

Saudosa Maloca

Adoniran Barbosa

Si o senhor não está lembrado

Dá licença de contá

Que aqui onde agora está

Esse edifício arto

Era uma casa véia

Um palacete assombradado

Foi aqui seu moço

Que eu, Mato Grosso e o Joca

Construímos nossa maloca

Mais, um dia

Nem nóis nem pode se alembrá

Veio os homi cas ferramentas

O dono mandô derrubá

Peguemo todas nossas coisas

E fumos pro meio da rua

Aprecia a demolição

Que tristeza que nóis sentia

Cada táuba que caía

Duia no coração

Mato Grosso quis gritá

Mas em cima eu falei:

Os homis tá cá razão

Nós arranja outro lugar

Só se conformemo quando o Joca falou:

"Deus dá o frio conforme o cobertor"

E hoje nóis pega a páia nas grama do jardim

E prá esquecê nóis cantemos assim:

Saudosa maloca, maloca querida,

Dim dim donde nóis passemos os dias feliz de nossas vidas

Saudosa maloca,maloca querida,

Dim dim donde nóis passemo os dias feliz de nossas vidas.

Posteriormente ele retorna ao tema em Abrigo de Vagabundos, que mostra que mesmo na adversidade é possível através da esperança e perseverança superar qualquer obstáculo e construir um presente melhor para si mesmo e que não se deve esquecer nunca de continuar lutando... e ainda ali ele se lembra dos amigos perdidos e deseja encontrá-los para abrigá-los em sua morada e tirá-los da marginalidade, prova máxima de humildade e dedicação aos amigos, como seria bom termos vários destes mártires silenciosos.

 

Abrigo de Vagabundos

Adoniran Barbosa

Eu arranjei o meu dinheiro

Trabalhando o ano inteiro

Numa cerâmica

Fabricando potes

e lá no alto da Moóca

Eu comprei um lindo lote dez de frente e dez de fundos

Construí minha maloca

Me disseram que sem planta

Não se pode construir

Mas quem trabalha tudo pode conseguir

João Saracura que é fiscal da Prefeitura

Foi um grande amigo, arranjou tudo pra mim

Por onde andará Joca e Matogrosso

Aqueles dois amigos

Que não quis me acompanhar

Andarão jogados na avenida São João

Ou vendo o sol quadrado na detenção

Minha maloca, a mais linda que eu já vi

Hoje está legalizada ninguém pode demolir

Minha maloca a mais deste mundo

Ofereço aos vagabundos

Que não têm onde dormir

Fazendo uma justa homenagem a Adoniran

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